O uso de agrotóxicos nos alimentos in natura e nas commodities, como soja e milho, tornou-se uma prática comum na agricultura em função da grande oferta desses produtos no mercado, mas a aplicação intensa nos últimos anos, tornando o Brasil um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo, tem consequências médicas e ambientais desastrosas, alerta o pneumologista e diretor clínico do Centro de Informação e Assistência Toxicológica de Santa Catarina (CIATox/SC), Pablo Moritz. Ele afirma que no estado os casos de intoxicações vêm progredindo gradativamente.
Para Moritz, projetos como os apresentados pela deputada Luciane Carminatti (PT), que veda a pulverização aérea de agrotóxicos, e do deputado Padre Pedro Baldissera (PT), que proíbe a fabricação e a comercialização do Diclorofenoxiacético (2,4-D), são importantes. Ele defende que o Brasil precisa rever a prática da pulverização aérea. “É um perigo e uma loucura a sua prática para os agricultores e para todo o meio ambiente.” Quanto ao 2,4-D, o médico lembra que ele era o “agente laranja”, usado como desfolhante pelo exército dos Estados Unidos na Guerra do Vietnã. “Além de fazer as folhas caírem, esse “agente” provoca alguns efeitos nada agradáveis em quem entra em contato com ele: câncer, doenças na pele, enfraquecimento do sistema imune e ainda doenças congênitas, ou seja, hereditárias.”
Segundo Moritz, estudos recentes confirmam que mesmo quando aplicados na dosagem prevista legalmente, os resíduos dos agrotóxicos independem da quantidade, e sim da época da exposição das pessoas, principalmente gestantes e crianças, a esses produtos. “A contaminação por agrotóxicos está cada vez mais chegando a níveis assustadores e resultando numa série de doenças, atingindo não só o homem do campo como a todos”, completa. Ele lembra que no Brasil há mais de 500 produtos agrotóxicos comerciais e que a maioria, além do produto principal, tem seus coformulantes, que são altamente cancerígenos e não são divulgados como deveriam.
Entre os anos de 1984 e 2018, foram registrados aproximadamente 250 mil atendimentos no CIATox/SC. São casos de intoxicação por diversos agentes, como medicamentos, agrotóxicos, produtos veterinários, raticidas, produtos químicos industriais e de uso domiciliar, abuso de drogas, plantas tóxicas e envenenamentos por animais peçonhentos.
Moritz diz ainda que os agrotóxicos atingem também o meio ambiente. Após ser pulverizados nas plantações, os agrotóxicos penetram no solo, tornando-o menos fértil e, com o auxílio da chuva e dos sistemas de irrigação, chegam aos lençóis freáticos e rios, contaminando a água próxima ao local. Dessa forma, a fauna e a flora brasileira corre risco, tanto pelo impedimento à proliferação de plantas por conta da infertilidade do solo, quando pela morte de animais envenenados que habitam a região.
Com o uso dos agrotóxicos, o médico aponta quatro consequências, como o surgimento de casos de câncer em vários órgãos. “Os principais casos de linfomas e leucemia estão ligados diretamente aos agrotóxicos.” A segunda consequência é a neurotoxicidade, que ocorre quando a exposição a substâncias tóxicas naturais ou artificiais, chamadas neurotoxinas, altera a atividade normal do sistema nervoso, aumentando casos de autismo, doença de Parkinson e de demências.
A terceira consequência é a desregulação hormonal, ampliando o número de casos de infertilidade, depressão, obesidade, autismo, alterações do comportamento sexual e vários tipos de câncer. E a quarta consequência é a disbiose intestinal, desequilíbrio da flora bacteriana intestinal que reduz a capacidade de absorção dos nutrientes e causa carência de vitaminas, aumentando casos de alergias, intolerância ao glúten e reumatismo.
Alimentos contaminados
O médico acrescenta ainda que estão contaminados alimentos como cereais, inclusive sucrilhos, cerveja, cevada, pão, bolachas, leites e derivados, que devem ser evitados legumes e frutas brilhosos e grandes, como morangos, mamão, tomate, pimentão, maçã, arroz e feijão. Para reduzir o consumo de agrotóxico em alimentos, o consumidor deve optar por produtos com origem identificada, e evitar produtos que não são da época, que vêm de longas distâncias. Essa identificação aumenta o comprometimento dos produtores em relação à qualidade dos alimentos, com adoção de boas práticas agrícolas. Alimentos orgânicos também são uma boa opção, pois não se utilizam produtos químicos na produção.
Os procedimentos de lavagem e retirada de cascas e folhas externas de verduras ajudam na redução dos resíduos de agrotóxicos presentes apenas nas superfícies dos alimentos. “Os supermercados também têm um papel fundamental nesse processo, no sentido de rastrear, identificar e só comprar produtos de fornecedores que efetivamente adotem boas práticas agrícolas na produção de alimentos.”
Fonte: AGÊNCIA AL