Entendimento da 2ª Turma do Supremo nesta terça-feira (24) questiona a competência de Moro para julgar Lula
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Juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba / Foto: Lula Marques |
Uma decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) tomada nesta terça-feira (24) pode colocar em cheque a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 12 anos e um mês de prisão, sentenciada por Sérgio Moro.
Por maioria, os magistrados decidiram retirar das mãos do juiz de Curitiba duas ações: a relacionada a uma suposta reforma de um sítio em Atibaia (SP) e outra que diz respeito à compra de um terreno que supostamente seria para a construção do Instituto Lula. Os casos deverão ser enviados agora à Justiça Federal de São Paulo, onde os crimes teriam sido cometidos, de acordo com a própria denúncia do Ministério Público Federal (MPF).
O advogado e membro da organização Terra de Direitos Fernando Prioste explica que a decisão da 2ª Turma do STF está baseada no princípio do juiz natural, ou seja, da competência que tem o juiz de uma determinada jurisdição de julgar as ações que chegam até ele.
“O juiz natural é aquele que tem a competência para julgar determinado processo. O juiz natural é aquele a quem é dirigido o processo que será julgado. Isso quer dizer que nem o juiz e nem a parte do processo pode escolher quem vai julgar. Em regra, o Artigo 70 do Código de Processo Penal estabelece que a competência para julgar os crimes ocorridos é o local da ocorrência do crime”.
Dessa forma, a 13ª Vara da Justiça Federal do Paraná, onde Moro está lotado, só estaria autorizada a julgar ações que tivessem relação direta com a Petrobras. Mas em resposta a um recurso impetrado pela defesa contra a sentença em primeiro grau, o próprio Sérgio Moro admitiu que o caso do triplex não tinha relação com a Petrobras. No despacho, o magistrado afirma: “Este Juízo jamais afirmou, na sentença ou em lugar algum, que os valores obtidos pela Construtora OAS nos contratos com a Petrobras foram utilizados para pagamento da vantagem indevida para o ex-presidente”.
Para Cláudia Maria Barbosa, professora de Direito Constitucional na Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Paraná, a partir dessa afirmação, o curso do processo deveria haver sido outro. “O procedimento normal seria assim: vamos imaginar que ele tivesse suspeitado de um esquema que poderia ter alguma relação. Ele, junto ao Ministério Público, avaliando e percebendo que a conexão não era direta, ele mesmo deveria ter remetido isso a São Paulo”.
Embora a decisão dos ministros da 2ª Turma do STF diga respeito somente às duas ações mencionadas, a linha de argumentação é a mesma utilizada pelos advogados de defesa do ex-presidente contra a sentença condenatória emitida por Moro no caso do triplex e poderia ter impacto sobre a condenação de Lula.
“Se nós retirarmos da justiça uma suposta pressão extramuros e tivermos um retorno ao Estado de Direito e à proteção constitucional que está estabelecido no Estado democrático, eu vislumbro duas possibilidades: ou poderia levar à nulidade do processo por conta do juízo ser incompetente ou então, no mínimo, a anulabilidade da sentença por ausência de provas”, disse Barbosa.
A contradição revelada no despacho de Moro foi um dos principais argumentos da defesa nos recursos apresentados ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) em Porto Alegre. Durante o julgamento, ocorrido no dia 24 de janeiro, os desembargadores evitaram entrar no mérito da questão.
“Eu tive o cuidado de ler o acórdão que levou à prisão e manutenção da condenação do ex-presidente Lula e o que se observa é que as questões jurídicas são muito fracamente debatidas. O que fizeram aqueles três desembargadores foi corroborar os argumentos do juiz Sérgio Moro. Havia mais de uma dezena de preliminares que iam desde a incompetência do juízo até a falta de matéria probatória e todas elas, talvez com exceção de uma apenas, foram ignoradas”.
Prioste explica que a retirada das ações da jurisprudência do juiz Sérgio Moro e o envio à Justiça Federal de São Paulo, implicaria a própria inabilitação para julgar o caso, pelo TRF4.
“Se a ação for para um juiz do mesmo TRF4, que compreendem os estados de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul, o tribunal competente continua sendo o TRF4. Mas se vai, por exemplo, para um juiz federal de São Paulo, já muda a competência e vai para outro TRF”. No caso, o TRF3 cuja abrangência engloba os estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul.
Em nota, a defesa do ex-presidente afirma que “não há qualquer elemento concreto que possa justificar a competência da 13ª. Vara Federal Criminal de Curitiba nos processos envolvendo o ex-presidente”. O comunicado diz ainda que “a decisão da Suprema Corte faz cessar de uma vez por todas o juízo de exceção criado para Lula em Curitiba”.
A defesa de Lula já entrou com recursos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando além dessa, outras irregularidades no processo que levou à condenação do ex-presidente.
Brasil de Fato