quarta-feira, 28 de março de 2018

Jesus, um inocente condenado à morte. Ele venceu!

imagem ilustrativa/reprodução


Era uma noite bem escura e os cachorros latiam. Eu e os meus dois irmãos mais novos estávamos sozinhos em casa e levamos um susto quando ouvimos um barulho na janela. Era um homem idoso, barbudo e cabelos compridos que batia com uma vara num vidro, ao lado da mesa onde estávamos jantando. Carregava um saco nas costas e, mesmo não fazendo frio, vestia muitas roupas, inclusive uma capa grande, velha, suja e rasgada que ia até os pés. Eu tinha 14 anos e sendo o mais velho, criei coragem e abri a janela. O homem mal conseguia se comunicar, falava rápido, mas me pareceu amigável. Ele disse que queria algo para comer e, também, permissão para dormir no paiol. Então o convidamos para entrar e jantou conosco. No lugar do medo emergiu em nós a curiosidade de saber como ele vivia. Então ele nos contou um pouco de sua história. Disse-nos que na sua juventude, cheio de sonhos, foi para a guerra mundial.
Algumas lágrimas saíram de seus olhos, ao nos contar dos horrores da guerra, dos amigos que morreram e desapareceram, dos tiros e gritos. Disse: “na guerra não se vê pessoas, só máquinas que matam... Numa ocasião ficamos três dias e três noites atirando sem parar. É por isso que estou assim, vivo na poeira da estrada, não tenho para onde ir, não tenho mulher, nem família, nem amigos, nada tenho, sou um andarilho, durmo em qualquer lugar, estou doente, me chamam de louco e só tenho comida quando alguém me dá.” Disse ainda: “Perdi meus documentos, então não pude provar que fui à guerra, e até hoje nada recebi dos meus direitos”. E, completou: “violência gera violência! A violência acaba com as pessoas e nada resolve!”
Eu pouco entendia de guerras. Achava que guerra era coisa de filmes importados dos EUA. Então aquelas palavras me despertaram o interesse em saber mais. Lembro-me que, na escola, me deparei com a expressão “guerras santas”, então eu me perguntava: se a guerra foi feita para matar, como pode ser santa ou ter aprovação divina? Na faculdade estudei sobre guerras que visavam derrubar opressores do poder e construir sociedades melhores. Um professor disse: “só matando os violentos para resolver o problema.” Mais uma crise! Eu me perguntava, como pode ser construída uma sociedade fraterna e pacífica por meios violentos? Os questionamentos aumentavam, mas não me dei por vencido. Nos últimos anos assistimos ao crescimento crescente e a multiplicação de guerras, massacres, fuzilamentos, extermínio de povos, de jovens, torturas, violências contra mulheres, migrantes, negros, gays, pobres; um ódio crescente e contagiante vem sendo promovido pelas grandes mídias e está levando às ruas muitos indivíduos com pedras, paus, ovos, chicotes, armas, cavalos e camionetas. O ódio, a calúnia, a mentira, a injúria e diferentes formas de violência tem ganhado espaços crescentes nas mídias, no parlamento, no senado, nos tribunais, nas casas, nas cidades e nas ruas.
Em Deus, que se revelou nos profetas e em Jesus Cristo morto e ressuscitado, está a resposta. Pelo profeta Isaias Ele falou: “já não aguento mais esses vossos sacrifícios e holocaustos”. Em outras palavras: Chega de violência! Chega de matar inocentes em meu nome! Jesus chamou os donos do poder econômico, político, jurídico e religioso de raposas, de hipócritas, de túmbalos caiados, de ladrões, de assassinos. Com a morte de Jesus as pessoas passaram a compreender que os violentos não agem segundo Deus e, sim, dominados por satanás. Jesus se colocou ao lado das vítimas, dos pobres, dos excluídos, dos doentes, dos pequeninos: “quando fizerdes isso a um destes pequeninos é a mim mesmo que estais fazendo”. Jesus, com amor, enfrentou a violência até a morte. Foi tão radical no seu amor que mesmo pregado na cruz, pediu ao Pai que perdoasse, isto é, que não usasse de violência matando os seus assassinos. A morte de Jesus, isto é, a sua vida doada até a cruz, sem entrar no jogo da violência, foi o maior exemplo de vitória sobre todas as forças e instituições da violência e da morte.
Recentemente, o papa João Paulo II afirmou: “numa guerra não há vencedores e perdedores, todos são perdedores.” No século passado além das duas grandes guerras mundiais, tivemos uma centena de outras guerras, com perdas humanas, ecológicas e materiais incalculáveis. Essas guerras foram sacrificando vidas, arrasando países, destroçando esperanças. Se a guerra é um câncer maligno que não tem cura, então nossa luta deve estar na prevenção! E esta passa pela educação, pela Igreja, pela família, pela escola, pela política, pelas mídias... Todos precisamos estar atentos, dispostos e comprometidos com a corrente e a defesa da paz.
Celebrar a Páscoa é celebrar a vitória da vida sobre a morte. É ressurreição. Em Jesus, Deus nos oferece sua vida cheia de amor, misericórdia, compaixão, solidariedade e esperança. Para que finalmente aconteça a paz verdadeira, faz-se necessário desmontar e desmascarar as injustiças, os golpes contra a democracia e remover suas iníquas consequências. O papa Francisco, com seu exemplo e suas palavras, insiste em afirmar que o mundo precisa de profundas transformações, precisa da grandeza de ânimo de líderes que tenham a clarividência e a coragem de lutar incansavelmente contra as injustiças sobre as quais se estrutura a atual ordem mundial. Só assim o mundo terá paz.


Pe. Dr. Gilberto Tomazi

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