A Assembleia Legislativa sediou na tarde desta segunda-feira (29) audiência pública sobre a implementação e os novos padrões de rádio digital a serem adotados como infraestrutura técnica em Santa Catarina e no Brasil. O encontro, promovido pela Comissão de Legislação Participativa, recebeu representantes do Ministério das Comunicações (MC), Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abratel), Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço).
Mais do que o debate acerca dos dois padrões que disputam a concessão no país para a radiodifusão digital, a audiência ampliou o coro de reivindicações das rádios comunitárias, que se sentem prejudicadas com a infraestrutura prevista no novo sistema. A deputada Angela Albino (PCdoB), presidente da comissão, disse que as discussões precisam se estender além das questões técnicas e avançar para as garantias da participação da sociedade através das rádios comunitárias. “Dependendo do sistema a ser adotado, podemos inviabilizar o funcionamento das rádios comunitárias no Brasil”, alertou a parlamentar.
Há dois anos, o Ministério das Comunicações vem realizados testes em três cidades, São Paulo, Minas Gerais e Brasília, para verificar a eficiência do sistema de rádio digital no país. Os padrões Tell HD (de uma empresa brasileira, com base no sistema americano,) e o DRM (de um consórcio internacional, com base no sistema europeu) foram testados em 20 oportunidades. Mas, segundo Octavio Penna Pieranti, diretor do Departamento de Acompanhamento e Avaliação da Secretaria de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações, nenhum dos sistemas vem correspondendo às expectativas.
“Tivemos perda do alcance do sinal nos dois sistemas, com a possível diminuição do número de ouvintes. E não é isso que o Ministério das Comunicações quer. Queremos a garantia da melhoria da qualidade do sinal e a ampliação do alcance das rádios. Por isso, estamos agendando nova bateria de testes”, explicou Pieranti. No Brasil não há previsão para o corte do sinal analógico das rádios (que operam no AM, FM e ondas curtas), e sim a implantação do sistema simulcasting (analógico e digital simultâneos).
Sinal fraco para as rádios comunitárias
Para que não haja problemas na transmissão analógica do sinal das rádios, durante os testes, são oferecidos 10% da potência atual para o sinal digital. Com isso, o MC faz projeções sobre o alcance da rádio digital. No caso da rádio comunitária, foi oferecido apenas 1% da potência atual para os testes (0,25 wats), com isso, o alcance do sinal atingiu o raio de apenas um quilômetro, o que inviabilizaria o sistema comunitário, segundo representantes da Abraço.
“Até agora não vimos vantagens para o sistema comunitário em nenhum dos padrões. Apresentaram testes com cem vezes menos potência, o que inviabiliza a manutenção da rádio digital. Queremos mais testes e em várias regiões”, pediu João Carlos Santin, coordenador jurídico da Abraço e membro do Movimento Nacional de Rádios Comunitárias (MNRC). Hoje, o sinal analógico das rádios comunitárias tem o alcance médio de cinco quilômetros.
Outro ponto levantado pelo MNRC é a incerteza sobre os custos elevados para a migração do sistema analógico para o digital. “Nem eles (os representantes dos novos padrões) sabem direito quanto vai custar. Estima-se que para uma rádio comercial, a mudança custe R$ 300 mil. As rádios comunitárias não têm condições de arcar com estes valores, mas também temos a preocupação de nos adequarmos ao novo padrão, pois daqui a alguns anos, os receptores (rádios domésticos) deverão receber apenas o sinal digital”, argumenta Santin. Segundo a Abraço, são cinco mil rádios comunitárias outorgadas pelo MC no país e cerca de 200 atuando em Santa Catarina.
Direitos iguais para transmissão
O deputado Padre Pedro Baldissera (PT), que propôs a audiência pública, ressaltou que o momento é de qualificar o debate acerca da maior eficiência das rádios, com a garantia de condições iguais de transmissão a todas.
“Precisamos dar mais qualidade aos nossos veículos de comunicação”, disse. Presente no evento, representando o Parlamento do Rio Grande do Sul, o deputado Adolfo Brito (PP) lembrou dos direitos dos cidadãos a um sistema eficiente e participativo. “Não é somente a qualidade do som que devemos debater e sim a maneira como vamos nos relacionar com a comunidade”, frisou.
O Ministério das Comunicações (MC) criou em 2012 o Conselho Consultivo de Rádio Digital para conduzir o processo de testes dos padrões digitais. O órgão tem a participação de 19 representantes do governo, associações de rádio e dos setores de radiodifusão público, comunitário, educativo e comercial. O MC conta com a parceria da Anatel, do Inmetro e da EBC (Empresa Brasileira de Comunicação) nos experimentos da rádio digital.
Encaminhamentos
O pedido de novos testes, de aprofundamento do debate com a realização de mais audiências públicas em outros estados e a inclusão de universidades públicas no processo de testes dos padrões digitais para a radiodifusão no Brasil foram os principais encaminhamentos do encontro realizado no Parlamento catarinense, a serem encaminhados ao MC através de requerimento da Comissão de Legislação Participativa do Parlamento catarinense. O representante do MC garantiu a realização de novos experimentos, porém sem calendário e locais definidos. O padrão digital também não tem previsão para ser implantado no país.
O novo sistema, além de possibilitar qualidade idêntica de som a todas as rádios, deve possibilitar mais interatividade com o ouvinte, como a sintonização através do nome da emissora, a inclusão de aplicativos gratuitos para a recepção de notícias em texto, fotos e até vídeos em baixa resolução. Dispositivos de alerta e a possibilidade de ouvir a mesma rádio em três canais com conteúdos distintos também serão possíveis.
Rádios nos EUA voltam ao padrão analógico
O professor da disciplina de Radiojornalismo do curso de Jornalismo da UFSC, Eduardo Meditsch, participou do encontro e chamou a atenção dos presentes ao citar dados que apontam a redução do número de rádios digitais nos Estados Unidos e na Europa. “Morei um ano nos Estados Unidos e presenciei isso. As pessoas não conhecem os receptores digitais e as rádios estão voltando ao padrão analógico. Para mim, o sistema digital já nasceu obsoleto”, alertou Meditsch, que tem estudos na área da radiodifusão.(Rony Ramos AGÊNCIA AL)