terça-feira, 11 de agosto de 2015

SÃO MIGUEL DO OESTE Projeto de Lei propõe reduzir para um dia Semana da Consciência Negra



Organizações se reuniram com a Comissão e Funcultura
para pedir esclarecimentos sobre a alteração da lei
A proposta altera a lei nº 6.357 de 07 de julho de 2010, sobre a qual está instituída a realização de atividades pertinentes a semana da Consciência Negra em São Miguel do Oeste. Nesse novo molde, apenas um dia da semana seria destinado ao estudo sobre a história da negritude no Brasil 



O Projeto de Lei apresentado pela Fundação Cultural do município de São Miguel do Oeste\SC, (Funcultura), assinado pelo presidente José Elias Araújo do Rosário, propõe reduzir para um dia as atividades correspondentes a semana da Consciência Negra. A proposta gerou revolta a Associação dos Afrodescendentes (Afrodesmo), organização que representa o Movimento Negro no município. 

Uma das justificativas apontadas pelo presidente da Funcultura, José Elias Araújo do Rosário, para a não realização de uma semana de estudos e oficinas populares sobre a questão da negritude no Brasil, é de que São Miguel do Oeste não possui atualmente uma semana destinada ás atividades alusivas as demais etnias. “A palavra ‘semana’ é inviável, isso porque as demais etnias não tem uma semana para elas também. Por isso, saí da audiência com a promotoria convencido de que realmente fazer apenas um dia para a Consciência Negra ficaria a contento de todos”. 

A ‘desculpa’ provocou ainda mais revolta ao Movimento Negro. Então, na última semana, a Comissão de Justiça e Redação da Câmara de Vereadores de São Miguel do Oeste, solicitou uma reunião com os membros da Afrodesmo e demais organizações, além da presença do presidente da Fundação Cultural. O principal objetivo da reunião segundo a presidente da Comissão, Vereadora Maria Tereza Capra, foi buscar um esclarecimento do Poder Público para a proposta de mudança na lei instituída desde 2010. 

Reunião 

Reuniram-se para discutir o Projeto de Lei, representantes da Afrodesmo, Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP), Pastoral da Juventude Rural (PJR), Presidente da Funcultura, José Elias Araújo do Rosário e vereadora responsável pela comissão de Justiça e Redação, Maria Tereza Capra. Durante a reunião, foi feita a leitura da lei n° 6.357 de 07 de julho de 2010, sobre a qual fica instituída a realização de atividades pertinentes a Consciência Negra em São Miguel do Oeste e onde consta que a programação deve ser coordenada pelo município, por meio da Funcultura e secretaria de Educação em conjunto com as organizações. 

Embora a lei deva ser cumprida, a manifestação de mudança para um dia de estudo sobre a Consciência Negra não agrada o movimento e as demais organizações. Em razão disso, o projeto será encaminhado para a Câmara de Vereadores fazer a votação e rejeitar o projeto na íntegra, ou então, elaborar emendas que contemplem as necessidades históricas do povo Afrodescendente. A perspectiva de aprovação da PL proposta pelo poder público, segundo a representante da Afrodesmo, Isete Carmen Lourenço, é inaceitável. “Enquanto ser humano, será que a atual composição do poder público tem consciência do que significa a consciência negra para nós? O que justifica essa alteração de lei?”, questiona.



39 ° melhor cidade para se viver, mas para quem? 

Ao longo das discussões, a representante da Afrodesmo, Isete Carmen Lourenço, questionou o poder público municipal que, conforme ela, tem se omitido em aceitar a realidade afrodescendente, bem como indígena e cabocla na história da cidade. 

Isete destaca que o município de São Miguel do Oeste ocupa o 8º lugar no país estando entre as melhores cidades para se viver, até 100 mil habitantes. Esse dado divulgado em 2013, é constatado por meio do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e é utilizado pela Organização das Nações Unidas (ONU) para analisar a qualidade de vida da população. São Miguel do Oeste estaria na 39ª posição em relação a todas as cidades Brasileiras. “Lugar melhor para se viver? Mas para quem viver? Os Afrodescendentes? Os indígenas? Os caboclos?”, pergunta. 

Isete ainda replica o argumento utilizado pelo presidente da Funcultura onde ele sugere que se faça apenas um dia para as atividades alusivas a Consciência Negra, já que, as demais etnias também não possuem uma semana exclusiva dedicada a elas. “As outras etnias tem espaço para se reunir, seus representantes são donos de comércios, empresas. Recordo que em 2012 foi realizado o primeiro seminário relativo a nossa data, em 2013 conversamos com membros da secretaria de Cultura e Educação e nada aconteceu, fizemos uma atividade na praça da cidade e ficamos sem luz, em 2014 ficamos sem som, será que é dessa forma que querem pensar esse ‘um’ dia para Consciência Negra?”, questiona. 

Além de representar o Movimento Negro, Isete é educadora. Ela acrescenta ainda que muito embora a lei de diretrizes e bases da educação nacional, que visa incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, exista, ela não é cumprida, o que torna ainda mais omissa a história dos povos na cidade e região. “Parece que a gente não faz parte da história de Santa Catarina”, declara. 

O representante da Pastoral da Juventude do Meio Popular, Paulo Fortes, lembra ainda que existe uma dívida histórica com a questão da negritude no Brasil. “Não há como consertar todos esses anos de escravidão, mas essa história precisa ser lembrada, precisa ser vivenciada, jamais esquecida. Quem constituiu a região onde vivemos? Foram os indígenas, os negros, caboclos”.

Fortes recorda ainda os seminários das etnias realizados há anos no município onde a história dos Caboclos por exemplo, sempre é ‘esquecida’. “Existe uma supervalorização a cultura Europeia e isso sempre foi notável nos seminários realizados pelos governos municipais aqui da cidade. Nas escolas outro exemplo, os estudantes não sabem o que foi o Contestado, o maior genocídio ocorrido aqui no estado e se não sabem é porque não há interesse de se falar disso, como acontece com a semana da Consciência Negra”, enfatiza. 

Outros questionamentos também surgiram durante a reunião, a exemplo da realização de uma semana enaltecedora da pátria, a semana Farroupilha, entre outros eventos. 

Sugestões 

Ao findar da reunião, a Vereadora Maria Tereza Capra, presidente da Comissão de Justiça e Redação, sugeriu uma avaliação da comissão junto ao encaminhamento de um ofício da Afrodesmo para que o projeto seja levado para votação na Câmara de Vereadores. Conforme a presidente da Comissão, ainda não há data para ser levado a votação, mas, ela adianta que deve ocorrer nos próximos dias.

Texto e Fotos: Claudia Weinman
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