segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Na íntegra: A CARTA DO SEMINARIO REGIONAL DOS 100 ANOS DO CONTESTADO

Vimos de todos os cantos desta terra “catarina” para participar do Seminário Regional sobre o Centenário do Contestado, a convite da CNBB - Regional Sul IV, que tem como uma de suas prioridades: contribuir e participar da celebração dos 100 anos do Contestado, . Somos cerca de 50 pessoas  representantes de vários movimentos sociais, populares, universidades, pastorais e dioceses de Santa Catarina.
Este seminário tem como objetivo refletir sobre o movimento do Contestado, desde as suas raízes, contexto histórico, consequências e atuais heranças, bem como assumir compromissos e planejar iniciativas em torno da memória, estudos, religiosidade, cultura e da celebração dos 100 anos do Contestado.
No primeiro dia do encontro, assessorados por Dr. Delmir Valentini, Dr. Paulo Pinheiro Machado e Pe. Dr. Gilberto Tomazi estudamos a história, as lideranças e a religiosidade do Contestado. Contamos também com a partilha de vários depoimentos, tais como o da Sra. Alzira Prates e Sra. Ezanir Palhano sobre religiosidade, memórias e experiências vividas em torno de João Maria e do Contestado.
Todos os participantes do seminário avaliaram a realidade dos últimos 100 anos de história no chão Contestado e concordaram que o povo da região tem sofrido por conta da discriminação, exploração, dos saques, do coronelismo, do desprezo cultural, da falta de reconhecimento dos valores e tradições religiosas e tantas outras formas de violências estabelecidas contra os(as) caboclos(as) e outros descendentes e remanescentes do Contestado.
Lembramos que a região do Contestado hoje conta com um bom processo de desenvolvimento no campo científico, tecnológico e industrial. Sua renda per capita está dentro da média do sul do país, todavia o Índice de Desenvolvimento Humano da região principalmente onde ocorreu o Contestado é dos mais baixos do sul do Brasil. Os investimentos públicos nas áreas do desenvolvimento humano, social, cultural e religioso são  muito escassos.  Essa realidade precisa mudar. Tal como nos ensinaram os caboclos e caboclas dos redutos do Contestado, precisamos aprender a viver de acordo com os princípios da igualdade, justiça e solidariedade. Devemos resistir contra o atual processo de globalização neoliberal capitalista, causador das desigualdades sociais. E promover alternativas, iniciativas e processos de economia solidária, valorização da cultura cabocla, socialização da renda, democratização, reforma agrária, defesa dos territórios e apoio as lutas pelos direitos dos quilombolas, indígenas, atingidos por barragens, pequenos agricultores e agricultoras, das mulheres, etc. Também valorizar as tradições, costumes, sabedoria e religiosidade cabocla, que insistem em manter viva a memória de “São” João Maria, José Maria, Maria Rosa, de outras lideranças e do próprio movimento do Contestado.
Para bem celebrarmos os 100 anos do Contestado, em nosso segundo dia do seminário, nós, participantes do seminário, assumimos alguns compromissos em torno da memória, do estudo, da divulgação, da religiosidade, da cultura e da busca de alternativas para o povo do Contestado, e manifestamos o desejo de todas as pessoas de boa vontade, entidades, instituições, movimentos, pastorais, somarem forças nessa empreitada prevista para os próximos 4 anos:
- Resgatar bibliografias e outros materiais referentes ao Contestado e produzir um folder ou cartilha (material didático-pedagógico) para tornar melhor conhecido o Contestado em todo o estado de Santa Catarina, procurando sensibilizar e dar maior visibilidade ao Contestado, valendo-se de todos os meios de comunicação possíveis (rádios, folhetos, informativos diocesanos);
- Valorizar o dia do Contestado, 22 de outubro, para fomentar debates, seminários, fóruns, e outras iniciativas em torno do Contestado, com maior envolvimento de pessoas, do poder público e da sociedade civil organizada.
- Identificar as lideranças, simbologia, arte e mística do Contestado, mapear as fontes, grutas, locais de batalha, cruzeiros, de São João Maria, como forma de recuperar a memória e resgatar os princípios que moviam os caboclos e caboclas dos redutos.
- Promover mobilizações populares e eventos tais como romarias (especialmente nos locais de conflito), audiência pública, mostra de cinema, encontros regionais entre descendentes do Contestado, estabelecendo parcerias para manter viva a memória do Contestado;
- Promover o resgate das diversas expressões de religiosidade e cultura do povo do Contestado; valorizando os grupos de cultura (teatro, dança, música, etc.) que mantém a memória viva do contestado;
- Firmar a presença profética da Igreja com as realidades gritantes sofridas pelos descendentes do Contestado;
- Reivindicar junto ao Estado a reparação das dívidas sociais para com a população cabocla do Contestado; propondo a criação de uma lei estadual para o livre acesso aos locais sagrados e aos pontos de memória do Contestado, tornando patrimônio público estes locais.
- Viabilizar a realização do Fórum Social do Contestado, incluindo o Tribunal do Contestado, como indicativo da 5ª Semana Social Brasileira.
- Aproveitar os temas das Campanhas da Fraternidade de 2013 e 2014 (juventude e tráfico humano) incluindo nelas a temática do Contestado;
- Resgatar a luta pela terra (dos Sem Terra, dos atingidos por barragens...) e de outros movimentos sociais, relacionando-a com o Movimento do Contestado; e promovendo debates e enfrentamentos aos grandes projetos capitalistas da região (barragens – pinus – grandes frigoríficos) e também do sobre o trabalho escravo e a precariedade do trabalho na região; apoiando projetos de desenvolvimento que visem fortalecer a identidade e a dignidade  dos descendentes do Contestado.
Estes são alguns compromissos e propósitos dos participantes deste Seminário. Também, reafirmamos que este programa de ação está aberto para novas proposições e parcerias na sua realização.
Agradecemos o esforço de todos na realização deste seminário  e contamos com a colaboração de todos e todas.
“Quem tem mói e quem não tem mói também, e no final todos seremos iguais.” (dito caboclo do Contestado)
fonte:Giba

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